
É no contexto da efémera iniciativa reformista do ensino de D. António da Costa (1870) que o Estado legisla (decreto de 02/08/1870), pela primeira vez, sobre bibliotecas públicas municipais, designadas então por bibliotecas populares.
A terminologia “bibliotecas populares” encerra, desde logo, todo um programa e distingue-as das bibliotecas eruditas. Estas bibliotecas têm como público-alvo o “povo” e destinam-se a promover o desenvolvimento dos conhecimentos das classes populares, inscrevendo-se assim no desiderato liberal que perspetiva a instrução e o conhecimento como condição fundamental do desenvolvimento das sociedades. No entanto, o que se pretende promover não é apenas um cidadão mais instruído, mas também moralmente alinhado com os valores da sociedade liberal, porque o que se quer proporcionar-lhe são recursos para uma “leitura moral e instrutiva” (artº 2º do Decreto de 20/08/1870). Por outro lado, a dimensão instrução é, pelo menos em parte, claramente indexada aodesenvolvimento económico, já que as futuras bibliotecas devem disponibilizar na oferta de recursos “revistas, modelos, manuais industriais, agrícolas, comerciais, desenhos e inventos relativos às artes e ofícios, conforme as especiais condições económicas e industriais da localidade” (artº 12 do Decreto de 20/08/1970).
Em termos de operacionalização deste serviço, câmaras municipais, juntas de paróquia e Juntas Gerais de Distrito podem criar bibliotecas, mas não são a isso claramente obrigadas. No entanto, as câmaras devem assegurar este serviço, pelo menos, na sede de concelho e financiá-lo à custa dos seus recursos orçamentais, prevendo-se a orçamentação do valor anual mínimo de 50,000rs. Adivinhando dificuldades de implementação, o Governo propõe-se apoiar estas bibliotecas, nomeadamente no fornecimento de fundos documentais. Outros tipos de apoio, por exemplo, de tipo financeiro não são especificados.
No que respeita aos fundos documentais, para além do aspeto já referido, estas bibliotecas devem ter um fundo documental representativo de uma grande diversidade de temas, elencando-se especificamente os seguintes: religião, moral, história, direitos e deveres políticos, viagens, literatura, higiene, obras recreativas e “quaisquer outras necessárias aos usos da vida das classes populares”. Este elenco é, a vários títulos, significativo na medida em que evidencia as principais preocupações do legislador, privilegiando as áreas das ciências sociais, da educação religiosa, moral e cívica, mas também a leitura como recreação e, claro, um tema cada vez mais preocupação social – a higiene.
Um ano depois, o governo regulamenta o funcionamento das bibliotecas (Portaria de 20/01/1871), no qual, para além de estipular aspetos técnicos, como a existência de um catálogo, estabelece a possibilidade do empréstimo domiciliário como forma de acesso às coleções, o que permite um claro alargamento e adaptação às formas de consumo e às práticas de leitura individuais. Apesar da efemeridade das iniciativas reformistas onde esta se insere, na década seguinte, os governos continuam apostados em criar condições para a continuidade deste serviço. Em primeiro lugar, regulamentando um horário de funcionamento (Lei de 18/01/1883) que prevê um período de abertura noturno, reforçando o acesso para todos, e, logo no ano seguinte (Lei de 28/05/1884),estabelecendo a possibilidade de aposentação dos funcionários das bibliotecas nos mesmos termos dos funcionários das secretarias das câmaras municipais, o que contribui para uma valorização do corpo técnico destes estabelecimentos públicos.
Bibliotecas no Distrito de Viseu
O impacto desta legislação no Distrito de Viseu é muito reduzido, excetuando os casos de Lamego e de Tabuaço, analisados mais à frente. Também no caso do concelho de Viseu foi possível identificar evidências de investimento municipal na criação de uma biblioteca pública, mesmo em fase anterior a este contexto, ou seja, durante a década de 60.
Efetivamente, apenas nos concelhos de São João da Pesqueira, São Pedro do Sul, Sátão, Tondela e Tabuaço ocorre, durante os anos 80, alguma despesa com bibliotecas, mas ela traduz-se em pequenos montantes e tem uma frequência episódica. Em alguns casos é possível identificar que se trata de apoios a biblioteca escolares.
Câmara Municipal de Lamego
A Câmara Municipal de Lamego inicia o processo de constituição da sua biblioteca popular com o investimento de um pequeno montante no ano económico de 1875/1876 e mantém este serviço em funcionamento até ao fim do período em análise. A despesa global durante este período ascende 17 678,057, representando, em média, quase 1,5% da despesa municipal (1,48%) no período entre 1881 e 1910[1]. O comportamento da despesa (cf. Gráfico 1) apesenta um crescimento quase linear até ao início da década de 80. A partir daqui continua a crescer, mas apresentando algumas oscilações. A partir de 1889/1890 inicia um percurso descendente até atingir, no início do século seguinte, um valor relativamente estável entre os 300,000 / 400,000rs.

Este comportamento explica-se pela evolução das diversas variáveis que compõem o agregado da despesa, a saber: aquisição e conservação de fundos documentais, recursos humanos e obras. Não existem dados para desagregar a despesa em todas estas categorias para todos os anos em análise, embora seja sempre identificada especificamente a despesa com recursos humanos.
A despesa nesta última dimensão emerge apenas em 1877/1878, com a contratação de um bibliotecário com o vencimento anual de 200,000rs., reforçada posteriormente, a partir de 1881, com um contínuo, com o vencimento anual de 108,000rs. A despesa com estes profissionais mantém-se constante ao longo do tempo, com as costumadas ocorrências de dívidas passivas em alguns momentos, tendencialmente pagas no exercício seguinte. À medida que a despesa com outras componentes oscila e, a partir de 1892, começa a decrescer até terminar em 1902, o peso da despesa com recursos humanos na despesa total com a biblioteca vai crescendo, a partir do patamar dos 50%, até se tornar exclusivo.
Não existem dados para caracterizar as instalações em que funcionava a biblioteca. É, no entanto, altamente improvável a construção de um novo equipamento, o que não poderia deixar de ter reflexo nas Contas. Parte-se, assim, dahipótese deutilização de um espaço já existente, que terá sofrido obras de adaptação entre a 2ª metade da década de 70 e os primeiros anos da década seguinte. A existência, quer de um valor significativo de despesa em obras em 1884 (336,234rs), mas sobretudo a tipologia de intervenções neste ano (aquisição de mobiliário e trabalhos de pintura) aponta para uma fase de finalização da adaptação do espaço. No entanto, não deixa de ocorrer, nos anos seguintes, nomeadamente 1888, 1890 e 1891, mais despesa com obras, embora de montantes inferiores. No entanto, o prolongamento das intervenções físicas não deve ter impedido o funcionamento do serviço, já que, como se referiu, ocorre a contratação de pessoal em anos anteriores, mas também a aquisição de fundos documentais.
A despesa com a gestão de coleções apresenta duas dimensões específicas que devem ser analisadas separadamente, a saber: a aquisição de fundos documentais, ou seja, de novos documentos para constituir e/ou desenvolver a coleção e a conservação dos documentos. Quer um caso, quer noutro só existem dados específicos para seis anos no período entre 1884 e 1893, o que não quer dizer que antes e depois a despesa não inclua investimento nestas duas dimensões. De qualquer forma, considera-se que estes seis anos constituem uma amostra com significado.
O total da despesa com a gestão de coleções ascende a 1 307,906rs, representando quase 30% (29,22%) do total da despesa com a biblioteca nos anos referidos. Esta percentagem é afetada pelo outlier de 1884, que é o ano com uma despesa muito mais reduzida face aos restantes. Assim, excluindo este outlier o peso da despesa com aquisição e gestão de coleções ascende a 32% (32,1%), ou seja, praticamente um terço da despesa, o que constitui um indicador da importância que esta dimensão adquiriu.
O total da despesa com conservação que, nestes anos, atinge a significativa soma de 372,785rs, representado 28,5% do total da despesa neste âmbito da gestão de coleções deve ser compreendida tendo em conta as práticas editoriais da época: muitas edições são publicadas em fascículos, o que obriga a constantes trabalhos de encadernação para garantir a sua conservação, e explica também que esta despesa acompanhe de perto a da aquisição.
A despesa com a aquisição de novas obras nestes anos ascende a 935,121rs, representando 71,5% da despesa neste agregado. Com este valor, foram adquiridos 172 novos títulos, representando uma média 28,67 títulos/ano (exclui-se a aquisição de fascículos do mesmo título ao longo dos anos, sejam eles de monografias editadas em fascículos ou fascículos de publicações periódicas). Este ritmo de aquisição de novos títulos garante uma atualização e enriquecimento mínimo da coleção disponível ao público.
Os anos de maior investimento são os de 1885 e 1888, com um total de 662,614rs, que representam mais de 50% do total da despesa com a aquisição de coleções, indiciando estarmos perante uma fase de crescimento significativo dos fundos documentais, integrado num momento de constituição da coleção inicial.
Tão importante como a tradução financeira do investimento, importa analisar e compreender o que foi adquirido. Uma análise temática, com base na taxonomia da Classificação Decimal Universal, revela (cf. Gráfico 2), em primeiro lugar, uma significativa diversidade temática dos fundos adquiridos, corporizando uma biblioteca com propósitos de representação de todos os domínios do conhecimento para responder a necessidades diversas. Corresponde, portanto, em certa medida, ao modelo de biblioteca previsto na legislação. No entanto, esta diversidade não esconde a predominância das ciências sociais e da literatura.

As aquisições na área da Literatura privilegiam a literatura portuguesa, sobretudo os autores de referência contemporâneos, como Alexandre Herculano, Almeida Garret, Guerra Junqueiro ou Camilo Castelo Branco, não esquecendo os clássicos como Luís de Camões, Padre António Vieira ou José Agostinho de Macedo. A literatura estrangeira encontra-se representada, para além dos clássicos como La Fontaine, Dante ou Molière, por alguns dos mais relevantes nomes da contemporaneidade francesa, como Émile Zola, Gustave Flaubert ou Lamartine.
O domínio da História encontra-se representado por alguma diversidade quer em termos de períodos cronológicos, quer de temas ou mesmo de zonas geográficas. Nesta diversidade, destaque-se, em primeiro lugar, as histórias globais, sejam elas universais, de Portugal ou da França. A título de exemplo refiram-se os títulos História Universal, de César Cantu; História de Portugal, de Pinheiro Chagas; e História da França (sem autor identificado). Nos casos de Portugal e da França, a existência de histórias gerais não exclui o tratamento de períodos ou aspetos específicos, inclusive com alguma importância conferida a épocas mais recentes. Refira-se, como exemplo, títulos comoHistória do Cerco do Porto, de Luz Soriano; Os portugueses na África, Ásia, América e Oceânia ou história cronológica dos descobrimentos, de Pinheiro Cagas; História da Revolução Francesa (sem autor identificado) ou De l’état de la France sous la domination de Napoleón Bonaparte, de L. A. Pichon.
O interesse pelos primeiros períodos da evolução humana é claro, traduzindo-se inclusive na aquisição de títulos específicos, nomeadamente a publicação periódica especializada Revista Arqueológica. Neste domínio encontram-se obras como Estudos pré-históricos em Portugal: notícia de algumas estações e monumentos pré-históricos, de Carlos Ribeiro; e Homem primitivo, de Louis Figuier.
A especificidade temática neste domínio atinge, por vezes, uma dimensão para além do racional identificado em títulos como Histoire de la caricature au moyen age, de Champfleury ou Resumé de l’histoire des grecs modernes, etc., de Armand Carrel.
Por último, destaque-se ainda neste domínio um título claramente destinado a especialistas que aponta para a reflexão sobre o processo de produção do conhecimento histórico: Ensaios de filosofia da história, de Joaquim António da Silva Cordeiro.
Para a área da Geografia/Viagens são sobretudo adquiridas obras de abrangência temática global, traduzindo-se em títulos como Dicionário de geografia universal ou Dicionário geográfico abreviado de Portugal e suas possessões ultramarinas. Tal não exclui a preocupação com áreas regionais e, como seria de esperar, a presença do título de referência Douro ilustrado: álbum do rio Douro e país vinhateiro, da autoria do 2º Visconde de Vila Maior.
É visível a preocupação em dotar a coleção de obras de referência, que desempenham o papel de propedêutica para um conhecimento mais específico. São os casos das enciclopédias gerais, dos dicionários universais e dos dicionários de línguas. Neste último caso, a oferta vai para além dos dicionários de Português para abranger, por exemplo, o Novo dicionário Português-Francês, Francês-Português ou o Dicionário Espanhol-Português.
Manter atualizado o público-alvo com a realidade contemporânea é objetivo claro, traduzindo-se na assinatura de publicações periódicas de referência que dão conta do mundo atual, tais como Ilustração de Portugal e do Brasil, Ilustração Ibérica,Ilustração Portuguesa, Mundo Ilustrado: revista de Portugal e do Brasil, O Ocidente: revista ilustrada de Portugal e do estrangeiro e o Jornal de Domingo.
O contributo da informação para o desenvolvimento e atualização do conhecimento sobre atividades económicas relevantes e a promoção de competências técnicas em profissões com deficit de conhecimento atualizado traduz-se, por um lado, no desenvolvimento das temáticas ligadas à agricultura, e por outro, na cobertura de áreas profissionais ligadas à construção civil.
No domínio da agricultura, a temática mais representada é, tendo em conta o contexto económico local, a da viticultura. Neste domínio encontram-se obras genéricas como o Tratado de vinificação, mas sobretudo publicações periódicas especializadas como A vinha portuguesa: revista mensal dedicada ao progresso e defesa da viticultura nacional, Jornal de Horticultura Prática e O Agricultor Português: jornal de agricultura, veterinária, ciências e artes correlativas: órgão do Conselho de agricultura do Distrito do Porto e da Comissão Central Anti- Filoxérica do Norte.
No domínio da construção civil, encontram-se sobretudo obras práticas como o Tratado completo de carpinteiro, Manual do Carpinteiro e Marceneiro, Tratado de carpintaria, Tratado completo de serralheiro e o Tratado de serralharia. A estes manuais profissionalmente especializados junta-se o título Arquitetura Prática, que sugere uma maior abrangência temática, sem deixar de apontar para um domínio de aplicação prática.
Refira-se ainda o domínio temático do Direito, com uma clara indexação à satisfação das necessidades da gestão municipal, visível em títulos de publicações periódicas como Legislação distrital e municipal, Revista de Direito Administrativo, Arquivo dos municípios portugueses e Gazeta dos municípios.
O tema da mulher, particularmente nas dimensões do seu comportamento moral e do casamento, é igualmente uma preocupação relevante, atestada pelos títulos como Histoire morale des femmes, L’amour, les femmes et le mariage, etc., Philosophie du mariage e Hygiène et physiologie du marriage.
Um outro traço assume relevância nesta coleção: quase 20% (19,19%) das obras adquiridas são em língua francesa. Esta influência francesa assume ainda uma maior preponderância se se entrar em linha de conta com obras traduzidas para língua portuguesa.
Por último, destaque-se a presença de pensadores contemporâneos de referência em vários domínios, com visões mais tradicionais ou inovadoras. Das poucas autorias identificadas, refiram-se nomes como Oliveira Martins (Sistema de mitos religiosos e Elementos de antropologia: história natural do Homem), Alexis de Tocqueville (Mélanges: fragments historiques et notes sur l’ancien regime, la revolution et l’empire…), Chateaubriand (O génio do Cristianismo) e o verdadeiramente inusitado romance socialista de Edward Bellamy Daqui a cem anos. Neste romance, editado em 1888, Bellamy “described the United States under an ideal socialist system that featured cooperation, brotherhood, and an industry geared to human need” (Brintannica).
Embora completamente imbuída do espírito, objetivos e características da biblioteca popular concebida pela legislação de 1870, a Biblioteca Popular de Lamego parece constituir um claro exemplo de inovação, já que no que é absolutamente essencial, ou seja, a informação que disponibiliza ao seu público, aproxima-se significativamente daquilo que o século XX virá a definir como a Biblioteca Pública de referência (Cf. Manifesto da Unesco sobre a Biblioteca Pública).
Câmara Municipal de Tabuaço
A implementação da Biblioteca Popular de Tabuaço, ao contrário do caso anterior, conta decisivamente com a intervenção do 1º Visconde de Macedo Pinto. De facto, António Ferreira de Macedo Pinto, membro de uma família originária do concelho, e que morre no Porto em 10/02/1879, deixa em testamento à Câmara Municipal um legado financeiro que, para além de se destinar à criação de uma escola profissional de agricultura, visa também a compra de livros para uma biblioteca popular, a juntar à doação de algumas centenas que já havia feito. Financeiramente, esta parte do legado tem um valor de 2 contos de réis, cujos juros devem então ser aplicados à aquisição de fundos documentais para a Biblioteca (Leal 1873, p. 105).
A doação de obras pelo Visconde de Macedo Pinto terá, então, criado as condições para a Câmara de Tabuaço criar, pelo menos, em 1875/1876 (é o primeiro ano em que existe despesa registada) criar uma Biblioteca Popular.
Se bem que inicialmente esta Biblioteca Popular pudesse constituir um serviço municipal completamente autónomo de qualquer outro, é facto que progressivamente ela vai ser integrada no contexto da Escola Macedo Pinto, passando a funcionar nas suas instalações, pelo menos, a partir de 1887, ganhando também a dimensão de laboratório de apoio ao ensino. É por esta razão que nos anos de 1887 e 1888 é incluída na despesa da biblioteca a aquisição de materiais e equipamentoscientíficos de apoio à lecionação do programa escolar, cuja despesa ascende a 91,043rs, representando apenas 7,8% da despesa com a Biblioteca. Esta relação umbilical entre a Biblioteca Popular e a Escola Macedo Pinto, que a transforma praticamente numa biblioteca escolar, determina a sua participação na fortuna da Escola na qual se integra (cf. Ponto sobre Escolas Profissionais). Aliás, a biblioteca é, no contexto, da escola a primeira entidade a sofrer pelas dificuldades de manutenção deste equipamento, pelo que a sua despesa termina praticamente em 1892 (a despesa registada em 1893 é apenas do pagamento de parte da gratificação ao bibliotecário que tinha ficado em dívida no ano anterior).
A despesa que se desenvolve então entre 1875/1876 e 1892, totaliza 1 167,046rs e apresenta grandes variações ao longo destes anos (cf. Gráfico 3)

Fontes: Contas de Receita e Despesa e Processos de Contas
Apesar destas oscilações, verifica-se que a meio da década de 80 a despesa apresenta uma tendência para o crescimento, que fica sobretudo a dever-se ao considerável aumento, para mais do triplo, da gratificação paga ao bibliotecário, provavelmente o próprio professor da Escola. Esta gratificação cresce, de facto, de 12,000 para 50,000rs.
As oscilações constantes da despesa determinam o pouco significado da média de 68,650rs (desvio padrão= 24,099 e coeficiente de variação: 35,1%.)
O custo global da Biblioteca é pouco significativo para o município, já que, em média, a despesa representa menos de 1% da despesa municipal (0,87%).
Apesar do aumento da despesa com bibliotecário já referida, é a despesa com a aquisição de fundos documentais, que ascende a 639,191rs, que representa quase 55% (54,77%) da totalidade da despesa.
A aquisição de fundos documentais, com dados específicos entre 1885 e 1890 (exclui-se desta análise a aquisição de materiais e equipamentos científicos), revela alguma diversidade temática, mas com um privilégio claro para a temática da Agricultura, revelando, mais uma vez, a importância da Escola Macedo Pinto (cf. Tabela 1)
Tabela 1: CM Tabuaço: títulos adquiridos para a Biblioteca, por temas (1885-1890)
Temas | Nº de títulos adquiridos |
1. Agricultura | 5 |
2. Direito | 2 |
3. Dicionários | 1 |
4. Geografia | 1 |
5. História | 2 |
6. Literatura | 1 |
7. Desenho | 1 |
8. Ciências aplicadas em geral | 1 |
Total | 14 |
Quer no caso de Lamego, quer no de Tabuaço os fundos documentais incluem a aquisição de um tipo de monografias particularmente característico do panorama editorial oitocentista. São as designadas coleções populares. Trata-se de coleções de divulgação científica para um público não erudito visando a formação deste nos conhecimentos científicos contemporâneos, adaptando texto e formatos às características de uma leitura menos exigente (Nabo, 2012). Assim, “os livros queformavam as coleções deveriam ser concisos e pouco volumosos, embora tivessem que conter os “conhecimentos uteis”, ou seja, o essencial do que havia sido produzido até ao momento pelo conhecimento humano, e ser, pelo seu baixo preço, acessível a todos os indivíduos.” (NABO, 2012, p. 27).
Os casos analisados revelam que, embora dentro do espírito da legislação de 1870, a implementação das bibliotecas populares poderá ter seguido estratégias diferentes: uma de iniciativa municipal, com recursos que advém exclusivamente da receita municipal e assumida pela autarquia como serviço ao cidadão com identidade própria; outra que a indexa ao contexto escolar e que parece depender mais do projeto de desenvolvimento local de um legatário, do que propriamente decorrente das preocupações municipais.
Particularmente no caso de Lamego a Biblioteca representa uma “lufada de ar fresco” no acesso à informação para todos, a qual, na sua diversidade temática, nos diversos níveis de profundidade com que os temas são abordados e no seu caráter formativo e prático apresenta potencialidades para informar e formar o cidadão contemporâneo.
Por último, a exemplaridade do caso de Lamego demonstra que estamos perante uma dimensão da atuação municipal à qual só os municípios mais fortemente urbanizados atribuíram significado relevante.
[1] Escolheu-se o ano de 1881 porque é a partir deste ano que o número de funcionários se estabiliza.
Como citar este texto:
Leitão, Paulo Jorge Oliveira – Bibliotecas populares e escolares. 2022.